É o governo que propõe...quem o deve fiscalizar.
Outubro 06, 2020
Sérgio Guerreiro
A função do Tribunal de Contas ( TdC) como órgão independente, exerce a nobre função de controlo e fiscalização dos dinheiros públicos. É um órgão de soberania e que Constituição de 1976 lhe conferiu natureza de Tribunal Superior. Já em Fevereiro desde ano, duas individualidades com “enorme” respeito pelos órgãos de soberania neste pais teceram vergonhosas considerações sobre a actuação do TdC ferindo, como nunca, a credibilidade desta instituição.
Fernando Medina, Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, diria “sobre o caso do ajuste directo dos imóveis da Segurança Social: “o Tribunal de Contas perde o seu tempo e recursos a fazer relatórios que são de uma baixíssima qualidade técnica e que têm um certo cariz e um certo panfleto de natureza política".
Tudo isto porque o TdC produziu um relatório que Fernando Medina não gostou tendo vindo para a praça pública desrespeitar este orgão de soberania que zela , dentro das suas possibilidades, o interesse público. Ou seja, é este órgão, de enorme relevância para todos nós, que nos diz a forma como o Estado aplica e gasta o dinheiro dos nossos impostos.
De seguida, outro governante desta vez o Ministro da Ciência, da Tecnologia e do Ensino Superior Manuel Heitor, arrasou o Tribunal por este fazer uma avaliação de índole política à forma como o governo canalizou as verbas para as universidades e institutos politécnicos. A auditoria realizada pelo Tribunal de Contas conclui que o modelo de financiamento do ensino superior público entre 2016 e 2019 não levou em linha de conta "qualquer indicador de desempenho ou de qualidade, não premiando o mérito, nem alavancando a excelência."
A instituição ao tempo liderada por Vítor Caldeira analisou os dinheiros canalizados pelo Estado para as universidades e politécnicos públicos e declarou que, nos contratos de legislatura assinados em 2016 não foi "aplicada a fórmula legalmente definida na Lei de Bases nem promovido o seu eventual aperfeiçoamento".
Manuel Heitor não se envergonhou, não vai de modas e afirmou que as recomendações do Tribunal de Contas são "um elogio à burocracia" e estão manchadas por uma avaliação política.
Com tantas facadas que se foi dando a uma Instituição como é o TdC seria fácil adivinhar o que aí vinha. E veio. Quem diz mal disto tudo não é reconduzido no cargo que ocupada mesmo que seja bom ou muito bom no que faz.
Veja-se também o que aconteceu com Joana Marques Vital. A Procurada Geral da República que deixou a sua marca na história da Justiça em Portugal em vários casos de corrupção.
O argumento do mandado único, não cola nem nunca colará. Nada na Lei existe para que se utilize este argumento. A verdade é só uma. Se quem representa a instituição não estiver de acordo com a política do governo, já sabe o que lhe acontece. Depois do TdC arrasar a proposta do governo sobre a Lei da contração pública, é certo que o seu Presidente já saberia o que esperar de António Costa.
O caso da não renovação do mandado de Vítor Caldeira que foi durante oito anos Presidente do Tribunal de Contas Europeu, é um caso claro e obvio que o governo não gosta de ser fiscalizado, e num Estado de Direito Democrático ninguém compreenderá que seja o governo a propor o nome de alguém para...ser fiscalizado.
Enquanto assim for, não vamos a lado nenhum.
Fotografia: Global Imagens / Gerado Santos